23/05/2023

Criança maxacali traqueostomizada se restabelece na comunidade indígena após longo tratamento em hospital da Fhemig

Cuidados especiais começaram nos seus primeiros meses de vida em razão de uma pneumonia grave

Referência na assistência às crianças traqueostomizadas, o Hospital Infantil João Paulo II (HIJPII) atendeu a primeira criança indígena a ser assistida pelo Sait (Serviço de Assistência Integral à Criança Traqueostomizada) em junho de 2017. A menina nascida na comunidade Maxacali, em Bertópolis, precisou ser intubada em decorrência de um quadro grave de pneumonia bacteriana e, com então três meses, foi traqueostomizada devido às complicações.

Submetida a uma série de cuidados especiais enquanto internada, I. Maxacali respondeu bem ao tratamento e foi decanulada (procedimento de retirada da cânula) no final de 2020, pouco mais de três anos depois do dispositivo ser inserido no seu pescoço. Intervenção cirúrgica que consiste em uma pequena abertura frontal na traqueia para aliviar a obstrução aérea do nariz e da boca, a traqueostomia conta com a cânula como uma via respiratória alternativa para possibilitar a chegada de oxigênio aos pulmões.


Sobre o caso

Enfermeira da Casa de Apoio à Saúde do Índio (Casai) de Governador Valadares e especialista em UTI pediátrica e adulta, Kátia Carlos Silva acompanhou todo o tratamento da criança, desde seu acolhimento e posterior encaminhamento ao HIJPII. Segundo Kátia, com dois meses, I. teve insuficiência respiratória e precisou ser referenciada para um hospital da região, onde ficou intubada. “Depois que teve alta, recebemos ela e entramos em contato com o Sait, em Belo Horizonte, para possibilitar uma assistência mais especializada”, relata.

“Após a intubação prolongada para dar o devido suporte ventilatório, diante da severidade da pneumonia, a condição de I. evoluiu para uma estenose subglótica, um estreitamento abaixo das pregas vocais. É comum nesses casos graves e também uma consequência da durabilidade da intubação”, explica Isabela Picinin, pneumologista pediátrica do HIJPII e médica coordenadora do Sait. Causadora da obstrução das vias aéreas superiores, a presença da estenose levou à necessidade da traqueostomia.


Uma história de superação

Por meio de uma técnica endoscópica de dilatação para viabilizar a passagem do ar, a estenose foi solucionada. Como esclarece Picinin, uma vez melhorada a obstrução das vias aéreas, é possível condicionar a criança a respirar pela via aérea anatômica (boca e nariz). Assim que se tornou mais independente da cânula, foi iniciado o “desmame” da traqueostomia, por meio de procedimentos para avaliar sua tolerância sem o dispositivo.

Com a retirada da cânula e uma boa resposta, I. precisou ser gradualmente restabelecida à comunidade indígena, já que ficou muito tempo afastada da sua cultura e não dominava a língua maxacali. “Ela é uma criança muito inteligente. Aprendeu rapidamente. Hoje tem 6 anos e fala fluentemente o maxacali. Criamos um grande vínculo com ela, mas nós como profissionais sabíamos que esse dia chegaria. Fizemos o melhor que podíamos e a devolvemos para seu lar. Continuamos recebendo notícias e ver ela bem nos dá uma sensação de dever cumprido”, fala Kátia.

Para Adriana Martinha Lopes Gonçalves, enfermeira coordenadora do Sait que também esteve presente ao longo do tratamento, I. sempre demonstrou ser uma criança alegre e feliz, mesmo estando longe de seus familiares. “Realmente foi muito emocionante o momento em que ela foi decanulada. Não tem preço aquele sorriso em seu rosto. É muito gratificante. Fiquei muito feliz quando soube que já faz mais de um ano que ela está junto com seus pais e irmãos falando maxacali”, comemora.


A importância do Sait

Durante o período em que esteve traqueostomizada no Sait, I. recebeu uma assistência com trocas de cânulas programadas a cada três meses e ações de prevenção de infecções. “Realizamos um treinamento para a equipe de saúde indígena, abordando os cuidados de higiene com a pele e como tratar as complicações relacionadas à cânula. Instruímos como proceder diante de uma decanulação acidental ou uma obstrução do dispositivo”, conta a enfermeira Adriana.

Além disso, I. contou desde seu primeiro dia com o acompanhamento periódico de uma equipe multidisciplinar, formada por pneumologista, broncoscopista, fonoaudióloga, fisioterapeuta respiratório, enfermeira, técnico de enfermagem, psicólogo e assistente social. “O tratamento conduzido pela equipe do Sait foi decisivo para que ela fosse decanulada. Graças à atuação coesa, com a participação de todos os membros e com a intervenção médica adequada, foi possível realizar um tratamento de excelência nessa criança e reintegrá-la à comunidade indígena”, destaca Picinin, que acrescenta que o caso de I. Maxacali simboliza o enorme impacto do serviço na vida de muitas famílias.

 

Por Cesar Ferreira, estagiário sob supervisão de Michèlle Guirlanda
Foto: Divulgação Fhemig/ Equipe do Sait (HIJPII)